Construir a paz nas mentes dos homens e das mulheres

Editorial

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Greek Euphronios crater, circa 515 BC. Illegally excavated in Italy in 1971, and bought by the Metropolitan Museum of Art, New York, in 1972, it was restituted to Italy in 2008.

Na primavera de 2020, a pandemia da COVID-19 provocou uma paralisação em todo o mundo. No entanto, o tráfico ilícito de bens culturais não parou. Pelo contrário. Os traficantes desses bens aproveitaram-se da segurança reduzida em sítios arqueológicos e museus para empreender furtos e escavações ilegais, com impunidade.

Os números comprovam: o fascínio por mosaicos, urnas funerárias, esculturas, estatuetas ou manuscritos antigos nunca foi tão grande. A pressão dessa demanda ajudou a alimentar o mercado ilegal de obras de arte e antiguidades, que agora opera principalmente online – por meio de plataformas que, muitas vezes, dão pouca atenção à proveniência original dos objetos.

Organizações criminosas e terroristas se apressaram para tirar proveito dessa brecha, utilizando o comércio ilícito para financiar suas atividades ou lavar (legalizar) suas receitas. Desde 2014, o Estado Islâmico vem organizando pilhagens volumosas e metódicas de sítios arqueológicos e museus nas regiões da Síria e do Iraque que estão sob seu controle.

Acredita-se que o fluxo ilícito de bens culturais é atualmente o terceiro maior em termos de volume, depois das drogas e das armas. Uma questão cultural, este negócio obscuro que prospera em áreas de conflito, também se tornou uma ameaça à paz e à segurança internacional.

A Convenção da UNESCO de 1970 relativa às Medidas a Serem Adotadas para Proibir e Impedir a Importação, Exportação e Transferência de Propriedades Ilícitas dos Bens Culturais, que celebra seu 50° aniversário em 2020, é mais do que nunca fundamental nessa luta.

Em meio século, muito foi alcançado para desenvolver leis preventivas, treinar profissionais, fortalecer a cooperação internacional e incentivar a devolução de obras furtadas ou exportadas ilegalmente. Uma maior consciência sobre os danos culturais, morais e materiais causados por esse tráfico, agora reconhecido como crime de guerra pelas Nações Unidas, é a prova disso. Também o demonstra a decisão tomada pelos Estados-membros da UNESCO de celebrar o Dia Internacional contra o Tráfico Ilícito de Bens Culturais, todos os anos no dia 14 de novembro. 

No entanto, a dificuldade de restringir o tráfico online, as débeis sanções aos infratores e a vulnerabilidade das áreas afetadas exigem hoje um novo nível de mobilização internacional.

Ernesto Ottone Ramírez

Diretor-geral adjunto de Cultura da UNESCO