
Editorial
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Ano após ano, os estudos científicos são condenados a registrar a sexta extinção em massa – o declínio dos organismos vivos, a perda de espécies, a superexploração dos recursos e a degradação dos habitats naturais. Os ecossistemas, que fornecem serviços essenciais à nossa existência, estão declinando em um ritmo sem precedentes, no contexto da crise climática.
No entanto, não é muito tarde para (re)agir. Medidas de conservação de longo prazo têm sido capazes de interromper, com sucesso, o declínio de algumas espécies ameaçadas. As áreas protegidas, que atualmente representam 17% da superfície da Terra, funcionam como um freio à invasão urbana e agrícola. A meta é chegar a 30% até 2030. Contudo, 100% da humanidade deve se ajustar à vida ao lado de todos os seres vivos, agora mesmo.
O conhecimento dos povos indígenas – com suas dimensões mitológicas e cosmológicas – é fundamentado em uma convivência mais harmoniosa com a natureza, e pode inspirar práticas mais respeitosas à biodiversidade. Pois, se o compartilhamento de dados científicos é essencial, é também necessária uma ação política em grande escala – além disso, a mudança exige – talvez antes de tudo – a consciência sobre as profundas e múltiplas ligações que nos unem à natureza. Por um tempo demasiado, a natureza tem sido apresentada como a antítese da cultura.
Chegou o momento de se questionar a concepção utilitarista herdada de Descartes, que apresenta os seres humanos “como mestres e donos da natureza”.
“A diversidade cultural é tão necessária para a humanidade como a biodiversidade o é para a natureza”, proclama a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural da UNESCO. Desde a sua criação, a Organização tem trabalhado para promover a reconciliação dos seres humanos com o meio ambiente – por meio de ações em prol do patrimônio mundial e do seu programa O Homem e a Biosfera (Man and the Biosphere – MAB) que celebra o seu 50º aniversário este ano.
Este número do Correio é um convite para nos tornarmos mais conscientes – a um reencantamento pela natureza, uma reconexão com ela, para nos abrirmos a novas formas de estarmos vivos, para nos maravilharmos. É um apelo para nos reinserirmos plenamente em nosso ambiente, para nos reconhecermos como seres vivos entre outros seres vivos. É uma tentativa de refutar a máxima do paleoantropólogo francês Pascal Picq, de que “o ser humano não é o único animal que pensa, mas é o único animal que pensa que não é um animal”.
Agnès Bardon